Antecipações poéticas

[Adriano Lobão Aragão

Há que se louvar aqueles que se dedicam a pesquisar, analisar ou divulgar a poesia neófita produzida no Brasil. Investir no novo requer um exercício complexo de discernimento e paciência, tamanha a enxurrada de edições, antologias, livros artesanais, livros digitais, sites, blogs, uma infinidade de versos e versejadores em busca de um mesmo lugar: o foco do olhar do leitor. Nesse emaranhado de palavras, deve-se valorizar o trabalho de pessoas como André Dick e Marco Lucchesi, por exemplo, que dedicam boa parte de seus esforços literários para compreender e propagar a obra de novos poetas contemporâneos. Acreditam, em seu labor, no valor de suas apostas, e assumem o compromisso de proferi-las. O lançamento do primeiro volume da série Poesia Contemporânea, intitulado Prévia Poesia, editada pela Risco Editorial, representa mais um esforço nesse sentido. Coordenada por André Dick, trata-se de uma realização do Governo de São Paulo e da Secretaria de Estado da Cultura, contando com a produção da Poiesis, Organização Social de Cultura, uma união de esforços em prol de um bem comum: a editoração e divulgação das realização poéticas de autores contemporâneos.

Como o próprio título da antologia sugere, Prévia Poesia antecipa alguns poemas inéditos de 10 poetas, a maioria em vias de publicação. Um interessante contato, sobretudo para os autores, pois permite uma escuta de como sua obra está sendo lida, uma antecipação do caminho que permitiria um melhor equilíbrio dos passos. O apoio de projetos como esse deveria ser um exemplo a ser seguido pelas secretarias de cultura dos demais Estados (apesar de algumas, como a do Piauí, sequer honrarem compromissos editoriais assumidos há alguns anos através de concursos literários, o que demonstra sua falta de interesse nesse âmbito).

Apesar de realizada pelo Estado de São Paulo, a antologia em nenhum momento mostrou-se bairrista. Buscou-se, ainda que breve, compor um painel que abrangesse diversas localidades e tendências, embora nenhum desses elementos possa ser compreendido como critério. O mais provável é que a geografia e a feição linguística da obra tenham espontaneamente apresentando seus matizes ao longo do processo de pesquisa e seleção, como as boas antologias costumam surgir. Não encontramos, pelo menos em uma primeira leitura, exemplos de uma poesia vigorosa e essencial, mas relevantes esforços em diversos momentos. Um bom indicativo para seguir em frente. Nas páginas de Prévia Poesia encontramos os versos de: André Ricardo Aguiar, paraibano de Itabaiana, antecipando “A idade das chuvas”, seu terceiro livro de poemas. Andréa Catrópa, paulista, além de autora, engajou-se na propagação da poesia contemporânea, tendo coeditado o jornal “O Casulo”, participado da organização da “Antologia Vacamarela – 17 poetas brasileiros do XX” e dirigido o programa de rádio sobre poesia contemporânea “Ondas Literárias”. Casé Lontra Marques, nascido em Volta Redonda (RJ), mas radicado em Vitória (ES), mantendo sua obra poética em intenso crescimento editorial e diversos experimentos estéticos, antecipa poemas de dois livros inéditos. Cláudio Trindade, paulista, residente em Florianópolis, artista visual e tradutor de haiku do poeta japonês Issa, explora os versos curtos e fragmentados em seu livro inédito “sem título”. Eduardo Jorge, cearense de Fortaleza, vive em Belo Horizonte (MG), antecipa poemas de “Minissérie casas-elástico”, livro contemplado com a Bolsa Funarte de Criação Literária, em 2010. Fabrício Marques, mineiro, antecipa “A fera incompletude”, contemplado com a Bolsa Funarte de Criação Literária, em 2008. Izabela Leal, carioca, pesquisadora e professora da Universidade Federal do Pará, apresenta poemas de “Correspondência”. Ranieri Ribas, baiano radicado em Teresina (PI), professor da Universidade Federal do Piauí, editou em 2004, pela Amálgama, “Os cactos de Lakatus” e, agora, antecipa poemas de “Aos renovos da erva”. Simone Homem de Mello, paulista, reside atualmente em Berlim, Alemanha. Como tradutora, dedica-se à poesia moderna e contemporânea de língua alemã e à obra do escritor austríaco Peter Handke. Tatiana Pequeno, carioca, apresenta poemas de seu segundo livro de poemas, “A torre fulminada”. 

É curioso notar que, dentre os participantes, a maioria não limita seu interesse poético apenas à produção. No prefácio da obra, Dick afirma que “aqui, neste livro que antecipa poemas de livros inéditos, também há poetas-tradutores, como Izabela Leal, Andréa Catrópa, Simone Homem de Mello, Cláudio Trindade e Eduardo Jorge, e críticos, como Ranieri Ribas, Fabrício Marques, Tatiana Pequeno e Andréa Catrópa, que analisam o cânone de Pound/Bloom, Leminski, poesia portuguesa e o cânone da crítica brasileira, respectivamente, além de um poeta que envereda também pela poesia infantojuvenil e pela crônica, como André Ricardo Aguiar.” Trata-se de um perfil bastante recorrente entre os atuais artífices do verso.

Não há certeza alguma de que os poemas apresentados em Prévia Poesia sejam novamente publicados sob essa mesma feição, ou que os livros inéditos anunciados venham a ser editados, ou reescritos, ou mesmo abandonados em prol de novas experiências, mas o certo é que trabalhar com poesia é certamente um laboratório contínuo, aberto constantemente a novas vivências e, no caso da antologia em questão, novas participações, conforme expresso na orelha do livro: “Você, leitor/poeta, também pode mandar seus originais para o e-mail: riscoeditorial.ineditos@poiesis.org.br. A Risco Editorial tem o objetivo de que esta série se transforme num espaço para discussão da poesia contemporânea e revitalização da língua e da cultura.”



[Publicado no jornal Diário do Povo, coluna Toda Palavra, Teresina, 29 de dezembro de 2010]

Comentários

Tatiana Pequeno disse…
Você e o W. fazem um trabalho que muito admiro. Obrigada por divulgar o que nos é tão caro.
Tatiana, obrigado por sua escrita e leitura.
José María, desejo um tempo própero de poesia para você e todos nós. Seja bem-vindo a estas humildes "páginas".