amálgama #6 - 3 Crônicas de Hélio Consolaro [02]

- Publicado em amálgama #6, março de 2008



OS SEGREDOS DO CARTÃO DE CRÉDITO
[Hélio Consolaro]





Li no Orkut o seguinte lembrete: “Salvar as minhas informações neste computador. Não use em computadores públicos”. Pensei nos computadores da prefeitura de Araçatuba, pois o prefeito tem secretários orcuteiros.

Na verdade, eu havia me contaminado com o sentido de que público é coisa do governo. As coisas governamentais devem ser públicas, mas não só. A escola pública quer dizer que ela é do povo, de todos. Assim, os computadores públicos são aqueles de uso coletivo, como os das redações de jornal, da escola e do cibercafé.

O público se contrapõe ao privado. Quando se faz publicidade, torna-se público, mas há também o direito à privacidade. Há muita gente que gostaria de ser bem conhecido, mas quando se torna celebridade quer o jardim doméstico. Não é uma contradição?

Ninguém consegue ser todo transparente, um livro aberto, temos uma reserva de privacidade que não revelamos nem ao psicanalista. Mas os atos e atitudes, como os pertences, nos revelam coisas nossas que nós mesmos desconhecíamos.

A Casa da Dinda foi o palácio imperial do então presidente Fernando Collor de Mello, em Brasília. A jornalista Edna Dantas fez a lendária reportagem à Folha de São Paulo: “O lixo da casa da Dinda”, onde revelou a privacidade do presidente da República pelo lixo deixado na rua para que os lixeiros recolhessem. Invasão de privacidade? Mas o lixo estava na rua, e a jornalista tinha vocação investigativa de um vira-lata.

Você, caro leitor, que se acha um pacato cidadão, pode ter sua vida devassada a qualquer momento. Exemplo: as compras por meio de cartão de crédito vão revelando por onde anda. Passou por uma floricultura, por motel, depois por restaurante. Essas três compras, em seqüência, revelam que o portador foi se encontrar com sua amada.

O rastreamento da conta telefônica, a violação da conta bancária, sem contar que um hacker pode descobrir com quem você conversa via Internet. E com tantas câmeras instaladas por aí, e os telefones celulares sendo mais máquinas fotográficas, nada mais garante a privacidade. Até as relações sexuais vão parar na Internet, para que os internautas exerçam seu voyeurismo.
Até imagino funcionários de bancos e cartões de crédito e de empresas telefônicas brincando de investigadores, tentando adivinhar por onde andaram os clientes.

– Olha, este viaja para o Nordeste!
– Esta arrumou namorado novo, telefonemas para um número só.
– Este sujeito está com alguém doente na família? Gasta suas reservas.

Privacidade, nem depois de morto, porque há os biógrafos.

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