amálgama #4 - ÁGORAdaTABA


ilustração: Netto

- Publicado originalmente em amálgama #4, agosto de 2003.





4 comentários sobre LEONARDO DA SENHORA DAS DORES CASTELO BRANCO


Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco (1788-1873) é um dos poetas piauienses que carecem de uma séria e rigorosa revisão e divulgação de sua obra. Escritor, revolucionário e cientista, autor de O Ímpio Confundido (1835) O Santíssimo Milagre (1839) e A Criação Universal (1856), desperta incompreensão e paixões diversas. Vejamos alguns comentários que servem de ponto de partida para uma futura revisão e para instigar o desafio.



[01]
“(...) Com pequenos laivos arcádicos, é tudo o que faz o leitor lembrar que seus versos poderiam ser literatura. (...)
Leonardo era homem de pouco estudo. Historicamente é nosso primeiro poeta, mais pela vida que levou, pela vontade que teve. No longo poema A Criação Universal, 1856, ele perseguiu ingenuamente a poesia científica. Ora, não pode haver poema científico. Poesia não é ciência. Ciência não é poesia. São duas linguagens distintas, impossível associá-las. Outra: ele escrevia para as reses, para o pasto, para as matas. Não havia leitores. Não havia escolas no Piauí, nem bibliotecas, nem jornais para publicar seus trabalhos.”

(Franscico Miguel de Moura. Literatura do Piauí, 1859-1999, Academia Piauiense de Letras, Teresina, 2001. página 46)



[02]
“Como homem de letras, Leonardo não teve, em seu tempo, leitores-críticos suficientemente preparados para compreender sua obra. Talvez pela dificuldade de acesso às obras ou preconceito ao censo épico adiantado em relação aos épicos clássicos, muito ao gosto no século XIX e parte do século XX. Muitos estudiosos, tidos como homens letrados, desqualificaram o poeta e sua poesia. Seguramente, neste início de século XXI, os seis volumes de sua tríade épica serão reeditados, por iniciativa de pessoas comprometidas em fazer leituras analíticas e críticas capazes de reabilitarem o poeta e sua poesia.”

(Luiz Romero Lima. Presença da Literatura Piauiense, 3.ª edição, Teresina, 2003. página 23)



[03]
“O poema A Criação Universal, de Leonardo, é dividido em seis cantos, segundo o plano da criação bíblica. Contém 4.247 versos soltos e numerosíssimas notas explicativas. É um livro ilegível, sem elevação de estilo, sem arte, cheio de pueridades. Não tem uma página, uma linha que possa merecer a posteridade. Tudo nele é prosaico e chato.”

(Clodoaldo Freitas. Vultos Piauienses, apontamentos biográficos. 2ª. edição, Teresina, FCMC, 1998. página 95)



[04]
“A verdade é a seguinte: espalhou-se, por aqui, ao longo de séculos, uma certa postura burra de desprezo por autores literários com cara de universal. Assim fizeram com Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco, tentaram fazer com Mário Faustino. E se não fossem os integrantes da Geração Pós-69, Torquato Neto seria, no máximo, um poeta baiano.
Daí a necessidade urgente de livrar Leonardo da peste analítica frouxa dos autobiografistas da terrinha, metidos a ensaistas, que continuam repetindo a impressão redutora de João Pinheiro de que faltava a Leonardo as ‘precípuas qualidades de poeta’. Nesse sentido é necessário colocar de novo em circulação as obras editadas por ele, e atualizar o raciocínio crítico a respeito do que escreveu. Como fizeram os irmãos Campos com Sousândrade. Como fez Ezra Pound com o provençal Arnaut Daniel. Essa é a única maneira de fazer com que as aves bico revolto do Canto 5 do verso 275 da Criação Universal de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco venham acabar com essa festa bufa dos autobiografistas piauienses de plantão.
No fundo, aqueles que se colocam como sucessores do João Pinheiro que, a respeito de Leonardo, copia simplesmente o pensamento do Clodoaldo Freitas, deixaram entre nós, uma grande dúvida: será que leram mesmo o Leonardo, ou estão blefando?"

(Rubervam Du Nascimento, poeta, autor do premiado livro Marco-Lusbel desce ao Inferno, Editora Blocos/Rio de Janeiro, 1ª. edição, 1993, onde dialoga, entre outros, com poemas de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco)

Comentários

Airton Sampaio disse…
Acho que o poeta Rubervam du Nascimento pôs o dedo na ferida. Qualquer aparente fuga a uma "piauiensidade" IMPOSSÍVEL DE SER DEFINIDA condena o autor que não falou de chocalhos e bumba-meu-boi a não integrar a literatura local, na verdade brasileira, na verdade ocidental (enquanto isso, comemoram-se por aí, com pompa e circunstância e ensaios caça-níquel, centenários de regionalismos tacanhos...). Por isso é que os paraenses, que não são burros, se "apropriaram" de Mario Faustino, tão pouco piauiense que pode integrar o cânone poético da literatura brasileira, mas não a piauiense. Por Júpiter, perdão, por Zabelê!
Airton Sampaio disse…
Por favor, na minha postagem, onde há "ensaios caça-níquel", leia-se "ensaio caça-níquel". O descuido com a língua portuguesa foi meu.